MORFODINÂMICA E MEIO AMBIENTE NA PORÇÃO CENTRO-NORTE DO PIAUÍ, BRASIL

Publicado
2015-06-01

    Autores

  • Iracilde Maria de Moura Fé Lima Universidade Federal de Minas Gerais,

Resumo

Os estudos geomorfológicos sobre o espaço piauiense se encontram em estágio inicial de desenvolvimento. Buscando contribuir para ampliar o conhecimento da dinâmica do relevo e de suas paisagens ambientais, foi escolhida como objeto de estudo a área formada pelo interflúvio do médio Parnaíba/baixo Poti. Com 6.380 Km2 , corresponde a um compartimento topográfico/geológico/hidrográfico que se destaca na bacia hidrográfica do Parnaíba como um espaço que se individualizou do seu entorno por apresentar dinâmica ambiental própria. Tal dinâmica se reflete na configuração espacial de uma grande “ilha” que, contornada por rios regionais: o Parnaíba, o Poti e seus afluentes, o Mulato e o Berlengas, tem na sua porção central o divisor topográfico comum para a drenagem local. Partindo da leitura dos mapas geológico, topográfico, hidrográfico e das imagens SRTM e LANDSAT, buscou-se indícios da existência de controle geológico sobre as formas dominantes de relevo local à semelhança do que ocorre no modelado regional. Dessa observação resultou a hipótese de que teria ocorrido um reafeiçoamento do relevo a partir do encaixamento do rio Parnaíba e da atuação dos processos morfogenéticos dele resultantes, que são mais recentes, sobrepujano o controle litoestrutural organizado até o final do Mesozoico/inicio do Cenozoico. O objetivo geral consistiu em compreender a morfodinâmica do relevo da porção centro-norte piauiense e suas relações com os demais componentes biofísicos do ambiente, com destaque para a dinâmica da drenagem do rio Parnaíba e sua participação na evolução dos ambientes dos conjuntos das sub-bacias do médio Parnaíba e do baixo Poti. Os objetivos específicos foram: 1) identificar os condicionantes geológicos para a dinâmica geomorfológica recente, a partir da análise da margem direita do médio Parnaíba; 2) gerar mapas temáticos e gráficos topográfico-geológicos do ambiente natural como suporte à análise e como síntese da dinâmica dos domínios das drenagens principais da área; 3) mapear e caracterizar as Unidades de Relevo resultantes da morfodinâmica atual, utilizando como referência básica o Índice de Rugosidade do Relevo Local (ICR); 4) identificar os processos de dissecação do sistema fluvial local, a partir da dinâmica da drenagem comandada pelo rio Parnaíba, e de sua posição atual em relação à topografia e à coluna estratigráfica da Bacia Sedimentar do Parnaíba; 5) contribuir para o estudo do ambiente natural dessa área, incluindo a identificação da composição físico-química das águas da drenagem local. Como base analítica, utilizou-se a visão integrada da Teoria Geral dos Sistemas, em especial a que orienta os trabalhos CSIRO nos estudos integrados de avaliação de recursos naturais, como apoio à proposta de mapeamento de unidades geomorfológicas, tendo como eixo condutor a morfodinâmica recente das paisagens locais. A análise foi conduzida a partir da organização e interpretação de mapeamentos temáticos da área de estudo, com base no entendimento de que os mapas não são apenas uma síntese, mas também um instrumento para a análise geomorfológica em várias etapas do desenvolvimento de uma pesquisa geomorfológica. O referencial analítico da pesquisa baseou-se na premissa de que a dinâmica recente da paisagem da área estudada deve encontrar-se expressa predominantemente através do grau de dissecação do relevo e de acumulação de sedimentos produzindo modelados locais, passivos de serem observados e identificados nas paisagens. As variáveis utilizadas para caracterizar a dinâmica recente do relevo, a partir das relações estabelecidas entre o relevo e demais componentes do meio ambiente natural, em cada conjunto de sub-bacias hidrográficas, foram principalmente os elementos lito-estruturais, o clima atual, a declividade das encostas, as classes de rugosidade do relevo, a vazão, o perfil longitudinal dos rios, a difratometria do raio X das argilas dos solos, bem como a participação relativa dos elementos do meio natural nas unidades de relevo. A estrutura do trabalho foi organizada em três grandes conjuntos de ações, sendo o primeiro a delimitação da área de estudo, com base na análise do mapeamento geológico e hidrográfico e também nas imagens Landsat TM e SRTM. O segundo conjunto correspondeu à organização/elaboração dos mapas temáticos, ilustrações e sistematização de dados sobre os conjuntos de sub-bacias dos rios Parnaíba e Poti, culminando no mapeamento e caracterização das Unidades e Subunidades de Relevo dessa área, a partir do cálculo e espacialização dos Índices de Concentração de Rugosidade do Relevo (ICR) e da elaboração de MDEs de vários locais de toda a área estudada, com o apoio de trabalhos de campo. As bases de dados foram trabalhadas principalmente nos programas ArcGis e Global Mapper. Para a delimitação das áreas de planícies e terraços fluviais utilizaram-se imagens do Google Earth e informações técnicas de poços tubulares perfurados na margem direita do rio Parnaíba na cidade de Teresina, associando-as às observações de campo. O terceiro conjunto representou-se pela análise comparativa da dinâmica das áreas formadas pelos conjuntos de sub-bacias hidrográficas, buscando checar o papel de cada fator na dinâmica do relevo. Diante dos resultados alcançados, considerou-se parcialmente aceita a hipótese levantada no início do trabalho, uma vez que uma parte da área de estudo, a sub-bacia hidrográfica do riacho São Francisco, instalada na área do Graben de Agricolândia, datado do Mesozoico/Paleógeno, continua fortemente condicionada à herança morfotectônica e ao controle lito-estrutural; enquanto as sub-bacias hidrográficas do rio Poti e do rio Parnaíba apresentam reestruturação da dinâmica superficial, iniciando o estabelecimento de um novo padrão de formas de relevo a partir do Pleistoceno. Este é resultante da recente e crescente influência da incisão do sistema de drenagem do Rio Parnaíba, ampliando a associação do relevo com a drenagem e seus efeitos sobre as encostas e reduzindo a influência direta da estrutura geológica. Identificou-se que o sistema de drenagem do rio Parnaíba no processo de encaixamento de seu vale criou desníveis altimétricos que atingem 350 metros entre o seu leito e topo do principal divisor topográfico de seus afluentes, o planalto/serra do Grajaú. Sua posição na coluna estratigráfica no contato das Bacias Sedimentares do Parnaíba e das Alpercatas fez aflorar nas encostas a sequência de rochas que compõem as Formações Geológicas do Carbonífero ao Jurássico, demonstrando, portanto, a grande intensidade dos processos da morfogênese Cenozoica expressa, sobretudo, na competência hidrológica desse rio. Considerou-se, ainda, que esta pode ser inferida como contemporânea ao processo de entalhamento pelo rio Poti, ao formar o seu boqueirão na borda leste da Bacia Sedimentar do Parnaíba. Os resultados indicam, portanto, uma morfodinâmica direcionada, em parte, pelo rio Parnaíba, demonstrando sua enorme influência e importância na evolução geomorfológica e geoambiental e também nos aspectos de uso e ocupação da terra da área de estudo.

Como Citar
de Moura Fé Lima, I. M. (2015). MORFODINÂMICA E MEIO AMBIENTE NA PORÇÃO CENTRO-NORTE DO PIAUÍ, BRASIL. Águas Subterrâneas, 27(3). Recuperado de https://aguassubterraneas.abas.org/asubterraneas/article/view/28441